Por que não fiquei rico com o futebol

O sonho da vida de meu pai era que eu fosse um craque de bola. Ele jogou muito, não foram poucas as vezes em que vieram me contar as maravilhas que ele executava em campo, jogador completo, não foi profissional por detalhe.
Dele, puxei o vício pelo esporte. Sou literalmente tarado por futebol, me interesso por tudo que esteja relacionado a isso e, claro, dou minhas corridinhas semanais. Quando pequeno, participei de várias escolinhas e, modéstia à parte, me destacava com a bola nos pés. Possuía técnica apurada, velocidade, visão de jogo, enfim, tinha a ferramenta. Chegaram a dizer para meu pai que eu seria melhor que ele.
Contudo, a preguiça me afastou dos treinamentos e, aos poucos, fui perdendo o ímpeto de craque. Continuava viciado no esporte, mas já não era mais um jogador decisivo e, paulatinamente, tornei-me comum, um desses caras que sabe debater numa mesa de bar sobre o desempenho do seu time no Campeonato Nacional, mas não converte essa sabedoria em lances geniais nos gramados.
Apesar de ser um preguiçoso convicto, não atribuo a esse pecado capital o meu insucesso dentro das quatro linhas. Futebol, além de habilidade e condicionamento físico, é principalmente uma questão de personalidade. Ou o cara tem perfil e alia isso à obstinação e se torna diferenciado, ou passa a ser apenas um coadjuvante em campo, que é o meu caso.
O goleiro, por exemplo. Muitos dizem que, para ser goleiro, ou o cara é veado, ou é louco. Do primeiro, convenhamos, estou a léguas de ser. Já a loucura, apesar de levar uns bicos na cara nas vezes que me arrisquei defendendo o gol, não foi suficiente para me tornar um legítimo camisa um.
Zagueiro, nem pensar. Zagueiros são seres do mal. O verdadeiro beque é um ser indócil, dotado de uma brutalidade que não dá espaço para sentimentos. Essa posição é guardada por homens parrudos, verdadeiros armários humanos, que não têm a mínima piedade em esfacelar tíbias, perônios e fêmures alheios. Definitivamente, mirradinho que sou, metido a intelectual e piadista, jamais teria êxito como um substituto do Lúcio na Seleção Brasileira. Vocês já viram a cara do Lúcio? Imaginem aquele dromedário dizendo "eu te amo" a uma mulher. Impossível!
Nas laterais, nunca me arrisquei. Os alas são ousados, rápidos e destemidos, porém inferiorizados. Tanto que, basta um lateral se destacar, que vira meia; são caras que, ou querem subir na vida e chegar à camisa 10, ou serão para o resto da vida reles habitantes das pontas do campo. Não sou um ícone de arrojo, mas também me valorizo, e nunca quis ficar à margem do campo, apenas correndo como uma ave pernalta tresloucada.
Meias de ligação, atacantes e centroavantes pertencem, em sua maioria, à mesma raça: a dos malandros. É necessário muito jogo de cintura para ser um jogador que tem o poder de definir a partida. São os camisa sete, nove, dez e onze, os mais ricos, os que têm as melhores marias-chuteiras, carros caríssimos, ganham prêmios de melhores do mundo, estão na mídia. Têm, também, a capacidade de lidar com o fracasso, o jejum de gols, são seres que sabem dar a volta por cima em qualquer situação. Não sirvo para malandro, sou certinho demais. Caras bregas não podem jogar na frente, lá é o lugar dos melhores, por honra e mérito.
No entanto, o futebol moderno foi generoso conosco, os comuns. Antigamente, havia o centromédio, um protetor da zaga, auxiliar do ataque, jogador versátil e extremamente útil. Falcão, por exemplo, e que baita exemplo. Com o passar dos anos, os esquemas táticos mudaram e nasceram os volantes: o primeiro e o segundo.
O primeiro é uma espécie de extensão dos zagueiros, um cara brabo, violento, sangüinário. Enfim, um cangaceiro, cão-de-guarda da defesa, nada pode passar por ele. Dinho, Sandro Goiano, Dunga, Simeone, Chuck Norris (apesar que esse joga nas onze posições, e ao mesmo tempo). Já o segundo, é todo aquele que pode ser denominado comum. O segundo volante não tem uma personalidade definida, é um carregador de piano, um Severino, um faz-tudo. Qualquer um pode ser segundo volante, basta que saiba dominar e chutar a bola.
Sou, portanto, um destes. Aguerrido, esforçado, mas nunca bandido. Malemolente, ladino, mas pouco comparado aos meias e atacantes. Coadjuvante, porém menos corredor que um lateral, e com a vantagem de estar na parte central do campo, participando ativamente, ainda que sendo minimamente diferenciado, da maioria das jogadas.
O mundo está repleto de segundos volantes. Somos nós, os caras que gostam de futebol e não resistem a uma pelada, porém dotados de pouco vigor físico para executar alguma função mais importante. Minha cultura futebolística é vasta, mas me contento em jogar na segunda função do meio-campo, pois dali posso contemplar a habilidade dos demais e ainda correr para comemorar os gols que meus colegas atacantes marcam.
É claro que há os que se destacam. Vejam o Lucas, por exemplo, ou o Ânderson, do Manchester United, que virou um primoroso segundo volante. Magrão e Guiñazu, no Inter, também executam essa tarefa com maestria. Falcão, se fosse jogador atualmente, seria um segundo volante de exceção. Todavia, são exceções. A grande maioria é apenas coadjuvante, meros operários. O meu destino dentro de campo, por sinal. Sou um bom segundo volante, mas chegar a essa posição me afastou, definitivamente, de ser um jogador de futebol profissional.

18 comentários:

  1. Bom Antonio não posso afimar se você foi desperdiçado pois nunca o vi jogar e até mesmo pq num entendo muito bem as posições dos jogadores (tipo, só o basico: goleiro, atacante e zagueiro. rs)!
    O bom que é se vc fosse um 'Kaka' da vida, acho que não iria te conhecer e quiçá ve-lo em Conselheiro Lafaiete, neh?!
    Hsuahushau
    Beijo
    =)

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  2. Acho que a grande maioria dos homens é assim. Não foram jogadores, apesar de ter sonhado com isso a infância quase toda, e claro que alternando com as fases de super-herói, astronauta, bombeiro/policial e tantas outras. Mas na adolescência se acharam e se impuseram outras carreiras, e mesmo assim não abandonaram a peladinha dos fins-de-semana, ou da quinta-feira à noite. Nem os jogos de futebol do time, nem as conversas nos bares.

    Bjo

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  3. Eu não te li, mas prometo que eu volto e tiro o atraso.
    Acho que o frio daí resolveu subir, e eu não ando nada nos meus melhores dias.
    Beijão!

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  4. Eu não entendo nada de futebol!
    Sempre quando vou no bar eu sobro na hora de falar de futebol. E olha q eu me esforço pra tentar aprender qlq coisinha.. mas desanda, n sei nada mesmo.
    =)
    bjs

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  5. Escolhas, querido Antônio.
    Eu, decididamente, não tenho persistência e disciplina para ser atleta. Eis a verdade.
    Mas q vc poderia estar aí, podre de rico jogando bola, podia, né? rs. Infelizmente o futebol é mais valorizado no nosso país do que o intelecto...
    Bjs.

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  6. E aí Antônio. Navegando pela blogosfera encontrei o seu blog. Parabéns cara, legal mesmo! Abraços

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  7. Pois olha primo, sempre gostei de jogar no gol e nunca fui louco muito menos veado, é lógico. Aliás, tive meus tempos aureos embaixo das traves. Lembro-me com carinho dos três anos de grande fase. Mas isso se foi e me bandiei pra outra arte. Mas o futebol continua uma paixão, evidentemente.

    Não creio que segundo volante seja insignificante. Não ganha milhões é verdade, mas um time é feito por 11. De que adiantaria ter 4 que matam a pau se não tiver o resto da estrutura?

    Um abraço.

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  8. Nem entendo quase nada de futebol, mas uma coisa eu sei: todo homem já sonhou em ser jogador de futebol. =D
    .
    Te add no orkut.

    :**

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  9. Não era pra ser.
    Com certeza você deve ter outros talentos tão bons como o de jogar bem futebol, o de escrever ótimos textos, por exemplo.
    Beijão.

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  10. Mas como jogador, vc é ótimo piadista!
    Amei o texto, apesar de ser 0 a esquerda no futebol (do tipo que não sabe o nome de 1 jogador da seleção).

    Beijos

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  11. Nunca é tarde para começar de novo. E jogador de futebol, mesmo os que "mal jogam", ganham super bem.

    Por que eu nasci sem pinto?
    (uoww, eu não disse isso).

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  12. Não entendo muito de futebol, mas seu texto me instruiu bastante no assunto rsrsr

    Mas deveria ter continuado... d´dinheiro rsrsrs

    bjs

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  13. Adorei isso de jogar no meio-campo pra ver tudo e comemorar os gols!
    Eu gosto, entendo, discuto, torço, xingo, assisto,já apitei(professora faz-tudo!), mas não jogo. Talvez por isso mesmo eu tenha destruído a jogada de um sujeito metido a besta num drible, que até a mim me espantou e deixou o destruidor de zaga com cara de tacho. Mas foi só aquilo e nada mais pelo resto da vida. Saí correndo. Eu, hein? Botar minhas canelinhas pra porrada?
    Console-se: carreira de intelectual dura mais. Não dá dinheiro mas pelo menos tem assunto.
    Abraço.

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  14. Parabéns, seu blog foi votado ao prêmio 5 estrelas.

    Participe vc tbm!

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  15. Antes de tudo, deixa eu explicar uma coisa: quando eu passo dias sem vir aqui, é porque tem algo errado. Minha irmã veio de férias pro Brasil e, como não a via a 2 anos, tenho que aproveitar, por isso ando afastada, mas, sempre que dá, dou um pulinho aqui....

    Caramba! Confesso que viajei um pouco no texto, pois, de futebol, eu não entendo NADA. Só sei o que é o campo e olhe lá... Não sei nem nome de jogador nem coisa nenhuma... Ou melhor, sem quem é o Carlinhos Bala do Sport, pois já o vi algumas vezes....

    Mas ei... Não importa se tu não foi profissional, o importante é que tu continuas gostando, né? Queria te assitir jogando algum dia... Quem sabe, né???

    Beijão pra tu

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  16. na real nao foi profissional pq teve preguiça, nao pq poderia ter sido um segundo volante, na minha opinião, nao vejo o futebol assim, como homens com suas funções isoladas, e um desmerecedores por serem os segundos, por é um time, uma equipe, se ganharam é merito de todos, poq nenhum Ronaldo neste mundo ganha jogo sozinho.


    bjs

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  17. Eu achava que não poderia imaginar mais nada depois de te imaginar sendo abduzido; mas depois que tu falou do Lúcio, a imagem daquele Orc, como tu mesmo disse,dizendo EU TE AMO à uma mulher que não fosse aquelas das cavernas,não me sai mais da cabeça...
    Como sempre o texto tá fora do normal!
    Beijos senhor segundo volante!

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  18. Você só me deixou com a impressão de que sei menos ainda de futebol.
    Bjitos!

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