A cruel vida canina - Parte 2

É engraçado como às vezes não percebemos o óbvio. A segunda-feira, por exemplo. Este é o dia dos apaixonados, ora bolas! É claro! Os namorados voltam de seus sábados e domingos regados a horas fulgurantes de amor intenso, beijinhos na ponta do nariz e folia debaixo dos lençóis; brigadeiro, pipoca, filmezinho a dois e pouquíssimas horas de sono, presumo. Quem não iniciaria a semana ouvindo o doce trinar do canto do rouxinol esverdeado?
Por outro lado, os solteiros, igualmente com poucas horas de sono acumuladas, voltam alquebrados de muita festa, bebida e tcha-tcha-tcha. As olheiras denunciam a jornada de farra intensa que, para alguns, já inicia quinta à noite. Quando vem a labuta novamente, o indivíduo pára pra pensar em quanto gastou, no quanto se divertiu e que, infelizmente, ainda faltam cinco dias para a próxima sexta-feira, ou seja, a depressão é inevitável.

Eu, por exemplo, hoje sou apenas um fragmento humano acometido de um bruto torcicolo que surgiu ontem, sem mais, nem menos. Saí do banho todo faceiro, me preparando para assistir ao jogo do Grêmio e clanc, a engrenagem direita do pescoço simplesmente travou. Agora estou aqui, à base de Abba, parecendo o Homem de Lata do Mágico de Oz: com a cabeça dura e sem coração (credo, que funesto).
Brincadeirinha, o fim-de-semana foi deveras proveitoso, realmente não tenho do que reclamar, apesar dessa pose de Robocop. Visitei um amigo que há tempos não via, fui pra noite e dilacerei minha musculatura nos gramados sábado à tarde, como todo bom atleta de fim-de-semana (apesar de também jogar às quartas e sextas).
Para fins de registro, é bom que se diga que a auto-estima vai muito bem, obrigado. Ano que vem, quando eu voltar a ler este texto, essa frase será muito importante, acreditem.

***

Ouvi ganidos estridentes. Reportei-me, então, ao mês de maio, lá para São Chico, naqueles dias em que fiz companhia para meu avô enquanto a vó Dilma estava no hospital. Certa tarde, sem muito o que fazer, lembro que escutei os mesmos ganidos. Fui, então, ao pátio dos fundos verificar o que estava acontecendo e deparei-me com uma cena pitoresca: meu avô segurava sua cachorrinha pela coleira, enquanto o machinho, subido nela, mandava brasa.
Perguntei, abismado, o que estava acontecendo, apesar de já desconfiar. "Ela tá no cio, tô dando uma mãozinha", disse meu avô, rapidamente, sem tirar os olhos do ato. Enquanto isso, o rapazinho errava a mira, descia, respirava duas, três vezes, língua de fora, cansado do serviço, e pulava de novo, dê-lhe bimbada. Até que, de repente, CRÉU!
Deu até pena da pobrezinha. Esbugalhou os olhos e partiu meu coração com um grito que deve ter sido escutado por toda a cidade. Mais uma virgindade que se esvaía naquele pranto canino, coisa mais triste de se ver, traumático mesmo. Fiquei uns três dias sem o mínimo tesão após aquela cena lamentável. E o vô ali, faceiro, oitenta e um anos, dando uma de cupido.
Quando o troço inchou, ele largou a coleira e eles ficaram ali, grudados, conforme relatei na quinta-feira, um olhando pro leste, outro pro oeste, o cachorrinho judiado da lida, inegavelmente cansado; ela, Deus defenda, praticamente estuprada, me olhava pedindo clemência, porém eu nada podia fazer, a não ser sofrer junto.
Pois bem, como lhes disse lá na primeira linha, ouvi ganidos, os mesmos ganidos. Entrei, então, em desespero: SOFIA! Corri para a janela e constatei a desgraça. Um sacripanta malhado de preto e branco lhe estocava sem dó.
Cerrei os dentes, apertei o punho e, colérico, grudei o cabo da primeira vassoura que enxerguei e disparei na direção do brutamontes. Foi o meu erro, meu maior erro. Rápido como um antílope perseguido por um leão nas savanas africanas, ele disparou em direção ao muro e, Deus do céu, pulou. Sofia berrava de dor alucinadamente. Sem sucesso no primeiro pulo, ele seguiu tentando, ao que minha pobre cachorra somente aumentava a celeuma. Imaginem a dor da coitada, grudada naquele mastodonte e suspensa apenas por um pênis corpulento.
Babando de raiva, paralisei. Se eu partisse para cima dele, ele pularia novamente e esgaçaria a Sofia mais ainda. Por outro lado, não podia apenas contemplar aquela barbárie passivamente, afinal de contas, o desgraçado era três vezes maior que ela, por conseqüência, o instrumento do cara era fatalmente o triplo em relação ao do Scooby.
Comecei, então, a urrar. Xinguei-o de todos os palavrões que conheço e ainda inventei mais uns quinze. Orei a Deus, quase aos prantos, pedi ajuda a todos os santos e, a cada pulo que ele dava, meu coração partia-se em mil caquinhos. Aquela atrocidade sexual acontecendo, e eu nada podia fazer.
De repente, desgrudaram-se. Com a genitália inchada, Sofia corre na minha direção, como uma criança chorando corre para grudar-se nas barras da calça do pai. E ele, o maldito bilhostre, pulou o muro com a avidez de um guepardo e a agilidade de um quati acuado. Com os olhos chorosos, minha cadelinha recebeu meu carinho. Maldito instinto.
Todavia, não pensem que terminou por aqui. Algumas horas depois, sorrateiro, observei o sedutor de cachorras indefesas novamente invadindo meu pátio. E, dessa vez, fui eu o guepardo. Abri o portão e o peguei desprevenido, tentando novamente aliciar Sofia. Com a sutileza de um campeão de sumô, desferi o golpe no crânio do sevandija que, cambaleante, ganiu de dor e, como Jadel Gregório não fez nas Olimpíadas, deu três pulos, sendo o terceiro por cima do muro. Como foi bom ouvir aquele ganido! Sofia, que apenas assistiu à cena, pareceu me olhar nos olhos, como quem diz apenas uma palavra: obrigado.
Se ele voltar de novo, preparem-se, pois o próximo post será uma receita caseira pouco ortodoxa: Testículos de cão sedutor ao molho de alcaparras. Por via das dúvidas, já afiei minha faca de churrasco.

16 comentários:

  1. Estou quebrada do fim de semana... e o sono nao me permite ouvir os rouxinóis.
    Passo aqui mais tarde para ler a história completa da vida canina.

    Bjs~!

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  2. Gente! Que dó. Tem que jogar água fria qye eles desgrudam...


    :*

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  3. Rá, rá, rá!... Mas e se vc se enganou, meu caro amigo? E se a sua Sofia estivesse apenas dando uma de difícil, como toda mulher, mas no fundo, no fundo, desejasse ser... er... possuída pelo cão-juan de meia tijela? Se fosse você tomaria cuidado de agora por diante...
    Valeu!

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  4. Eu tô um caquinho do fds... nao resta nada de mim, nem sequer um pó... e, quer saber mais? não quero essa receita! aahahah

    Beijos.

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  5. Tadinha Antonio. quase chorei agora....hehe
    Ainda bem que sou gente! huahauahu
    "cerumano" - hihi
    Não sei pq, mas minhas olheiras na segunda-feira são "algo"! Essa vida de solteira tá me matando também, hehe...Êta vidão!
    Meu humor hoje tá ótimo, deu pra notar né?! talvez pq é terça-feira já, e já tô contando as horas pra sexta chegar...rrsrs
    Beijão!

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  6. Que momento! Heim...
    Nuss, imaginando vc xingando o cachorro... rs

    Qto a vida de solteira, bom... é bem assim msm, q a semana passe logo pra curtição do fds... rs
    Êh vida boa...

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  7. Aiii Antônio!
    Eu sinto uma coisa muito, mas muito ruim quando eu leio você falando da pobre da cachorra...

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  8. Voltei a atualizar o blog (: Tem continuação do conto.

    obs: se não fosse cruel a vida canina, até que ela seria uma delícia.

    Abraço

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  9. kkkk, desculpa os risos, amigo!
    Antes de mais nada, preciso registrar que vc me causou uma leve indigestão, pois eu havia acabado de comer um bife ao molho de alcaparras no almoço...

    Coitada da Sofia... Espero que vc aumente o muro de sua casa à partir de agora...rs


    ABS.

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  10. Nossa, cruel você... Mas sei que é protegendo a sua cachorra que você tanto ama.
    E bom saber que está tudo bem por ai.
    Bjitos!

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  11. Coitadinha da Sofia...
    Sofri com ela só de ler...

    Beijão pra tu

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  12. Ê coisa boa é essa tal vida de solteiro heim? =)

    Bate um desespero, uma dó quando você fala da cachorrinha.

    Beijão, moço!

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  13. No post que você acabou de comentar tem convite para você.
    Volta lá! :)
    Bjitos!

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  14. 1. Não gosto da segunda-feira de jeito nenhum, seja depois da farra ou depois do fim de semana a dois. Segunda tem engarrafamento, buzina, leseira, e sono.

    2. Como assim você tá impedindo a natureza?!!! O pior é a primeira vez, depois fica bom.

    Bjo

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  15. E quem vai comer a tua receita???
    Só que falta sobrar para a pobrezinha da Sofia...rs.

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  16. Quase igual aconteceu com uma cachorrinha que eu tive! O fiodaputa do cachorro tbm tentou pular o muro grudado nela!
    Joga água que é melhor do que espantar o insolente!
    Agora, sem querer piorar as coisas (e já piorando), só torce pra ela não emprenhar do invasor
    *corre

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