Minha doce capivara

Hoje de manhã, estava eu caminhando pela rua, lépido e faceiro, assoviando cânticos de louvor por mais uma sexta-feira que nos abençoa, quando, de repente, enxerguei uma guria que não via há muito tempo. Foi uma olhada rápida, porém suficiente para constatar seu aspecto de capivara inchada, coitadinha. Logo ela, que até que era ajeitadinha há uns anos atrás, agora não presta nem para fazer sabão.
Há uma história engraçada entre mim e a pinguancha. Aliás, logo que a vi, recordei o fato e segui rindo sozinho. Portanto, como estou transbordando bom humor, dividirei com vocês mais uma de minhas peripécias da tenra adolescência, que se foi para nunca mais voltar.
O ano eu não lembro, sei lá, meados de 2001 talvez. Houve um almoço na paróquia perto da minha casa e eu, participante ativo que era destes entrementes ecumênicos, apareci por lá para encontrar alguns amigos. Éramos três, mais a mãe de um deles, acomodados confortavelmente numa mesa, conversando animadamente sobre um assunto qualquer.
Sem mais, nem menos, eis que surgiu um ex-colega de Crisma puxando assunto, chamá-lo-ei de Pafúncio. Boa gente o Pafúncio. Contudo, o assunto que o trouxera até mim não era dos mais agradáveis: queria que eu ficasse com a dita cuja citada lá no começo. Até que, na época, a rapariga tinha lá seus predicados, era engraçadinha e talicoisa. Mas, sei lá, não me atraía. Também, eu devia ter dezesseis, no máximo dezessete anos, guri verde, ainda aprendendo a chupar Halls, não tinha a manha do ganso, se é que me entendem.
Bueno, o caso é que recusei de pronto. Sem chance. Dei a desculpa de estarmos na igreja, tá certo, não era exatamente dentro dela, mas ainda era o salão paroquial, na frente do padre, as catequistas, as tradicionais velhinhas que qualquer paróquia conserva, coroinhas, arcebispo, freiras, a mãe do cardeal, enfim, não havia a menor possibilidade de acontecer.
De longe, notei que era vigiado constantemente. Era ela, a capivara. Metralhava-me com seus olhinhos vorazes, como quem diz "hoje tu não me escapa", um olhar de sofreguidão, de ânsia fulgurante por dilacerar meus lábios. Fiquei apavorado, essa que é a verdade. A guria já tinha fama no bairro, as más línguas contavam que ela era capaz dos maiores escândalos. Diziam, inclusive, que certa vez ela se pelou na frente do antigo namorado, um bolha o coitado, que, estupefacto, nada fez. Convenhamos que uma guria pelada na frente de toda a paróquia acarretaria no esmagamento da minha reputação frente à comunidade, algo que me gelou a espinha.
Desviei o olhar e procurei me concentrar na conversa. De vez em quando, o Pafúncio passava por mim e dava uma piscadinha, inclinava o queixo na direção dela, erguia as sobrancelhas duas vezes bem rapidinho, me dava tapinhas no ombro. Enfim, o clima foi ficando ameaçador. E, pra botar a caçada no mato de vez, algo pavoroso aconteceu. A mãe do meu amigo trocou de mesa, ele juntou-se aos músicos para tocar no evento e o último, ah, o único alento que me restava, simplesmente ergueu-se da cadeira e disse: "tenho que ir, tchau".
Foi tudo muito rápido, essa que é a verdade. Mal o cara saiu, não tive tempo nem de piscar duas vezes, me chega o sacripanta do Pafúncio com aquele fantasma ao seu lado, cataplof. "Pronto, agora conversem", foi só o que ele disse. Quando abri a boca para dizer "mas...", o filho de uma égua já caminhava longe. E o pior é que nem pude praguejá-lo, pois, ao virar a cabeça para o lado, dois olhinhos atentos me fitavam, mais parecendo duas jaboticabas maduras.
Não tive nem assunto pra inventar, minhas cordas vocais travaram completamente. Ela foi chegando perto, chegando perto, mais perto, pertíssimo, quando consegui finalmente balbuciar algo que me salvasse:

- Vamos lá para a rua? - se fosse para ser guilhotinado, então que o padre não presenciasse a execução.

Felizmente, ela aceitou. Levei-a para os fundos da igreja, perto do cemitério. Por um momento, quis trocar de lugar com os habitantes daquele lugar, pedi, clamei, "Jesus, me leva", mas não, tive que encarar a situação. Antes que eu dissesse meia sílaba, fui grudado pelo pescoço e senti aquele desentupidor de pia dando uma geral na minha boca. Se tinha algum pedaço de galinha no meio de algum dente, certamente foi aspirado, porque a volúpia daquela guria foi algo impressionante.
Durou pouco, graças a Deus. Após quase me debater, consegui sair daquele emaranhado de dedos e ficamos só de mãos dadas conversando qualquer porcaria. Então, ela começou a confessar que me notava há tempos, me achava isso e aquilo, e aquilo outro, patati patatá, enfim, comecei a filtrar aquela blateração e a visualizar somente aquela cena dela tirando a roupa na frente do bolha do ex-namorado. Já suando frio, transferi a cena para os fundos da igreja, diante de centenas, milhares de defuntos, imaginem a heresia!
Apavorado com tal possibilidade catastrófica, inventei uma desculpa e fui ao mundo. Ela aceitou novamente, um pouco cabisbaixa, mas aceitou. Sebo nas canelas, fui reto pra casa sem nem olhar para atrás. Disso eu lembro até hoje, da minha chegada em casa, o Grêmio perdia para o Guarani no Campeonato Brasileiro e eu baixando uma música do Milionário e José Rico, exultante por ter conseguido fugir da capivarinha.
Depois daquele episódio nefasto, não pus o nariz pra fora de casa por mais de duas semanas, afinal de contas, ela morava na rua do lado, eu tremia só de pensar em encontrá-la novamente. Passado o susto, comecei a fazer caminhadas curtas e esporádicas, sempre atento às esquinas, evitando passar em frente à casa dela, aliás, até hoje cruzo pouco por ali.
Tantos anos depois, acabei testemunhando pela manhã o seu estado deplorável. Realmente, eu podia ser novo, guri verde e juvenil, pouco conhecedor dos mistérios do amor, mas meu instino não me traiu. Tivesse me iludido, teria hoje uma capivara ao meu lado. E, ainda por cima, inchada. Valha-me Deus, nosso Senhor!

12 comentários:

  1. Sem comentários,hsaushaushaushaushaushaushushushuahsuhsuhsuashuashaushaus
    Imaginei a guria pelada no cemitério...uahsauhsuhsaushuahsuahushsuhsushushushaushaushuh!
    Que momento, hein?!Te escapou legal!
    hsuahsuhsauhsuhsauhsaushaushaush.

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  2. Coitada da menina! Coitado de vc!

    Medo desse pessoal louco!

    Bjo

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  3. Fiquei com d[o da menina por você chamá-la de capivara inchada, mas não pude deixar de rir com o post. E de ficar com dó de você também... hihihi
    Bjitos!

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  4. Me fala mais desse Pafúncio, ele era o cupido da quermesse?
    Eu ri muito com a sua história. Me lembrou a minha adolescencia, mas quando me convidavam pra ir atrás da igreja eu não fugia! hahahaha
    Tudo com muita inocência é lógico, até pq sou filha de dois catequistas, na teoria eu sou o exemplo, na prática.. Mas me conta, esse Pafúncio era bonitinho? Por onde ele anda?

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  5. Jura que o Pafúncio era boa gente? hahaha!

    :*

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  6. Risos!!!
    Seus textos são ótimos, Hilários!!!
    Beijinhos!!!
    Thaís M M

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  7. Estupefacto, hein???

    O que faltou na vida dela foi uma bela motivação - um belo momento!

    Vai saber...

    beijos prá vó Dilma.

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  8. Qta maldade com a garota...
    E se ela for legal?? rs

    Bjs~~

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  9. kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
    Ai, Branquelo, vc faz minha alegria, sabia?
    uahuahuahauhauahuahuahauhauahuauah

    Me lembrei de uma coisinha tosca que já passou pela minha vida, um dia eu conto!

    Já pensou que casal bonito seria hoje em dia?!
    =X
    hahahahahahaha

    beeeijooooo, pessoinha linda da minha vida

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  10. Show, se era pra ser cômico, ri muito..hehehehehheeh

    parabéns pelo blog, cada vez que e para aqui e leio alguns textos, vejo e aprecio com moderação a evolução deste espaço tão criativo e divertido!

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  11. HSUAHSUAHSUAUSHAUSHAUSH. ai meu Deus , só mais um pouco USHUAHSUAHSUAHSUAHSUAHSUAHS. para tudo, me matei de ri aqui , e não me interprete mls não rio da sua desgraça não. longe de mim ! mais mas pelo modo que contaste a estória! Muito! Muito bom! :) Como eu sempre digo , algumas pessoas com o passar dos anos amadurecem e viram frutos lindos outras por si apodrecem *o* HSUAHSUAHSUAHS.

    ' Beijoooos :*

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  12. hahah, muito bom! cada história, querido! espero nunca ter sido a capivarinha de ninguém... (ui, que medo! rs...) mas seu "amigo" é que aprontou, hein?! deve ter dito pra moça que você tava de olho nela... :)

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