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Dentro de poucos dias, um de meus melhores amigos contrairá matrimônio. Parece doença, mas é redenção. Casar-se, nos dias atuais, é digno de medalha com honra ao mérito. Constituir uma nova família é desafio que só encara quem tem a certeza de que pode fazer a diferença.
Em se casando um cara de quem sou grande amigo, fui agraciado com o posto de padrinho. Sendo padrinho, fui ontem comprar a fatiota adequada para a ocasião. Sou fã de terno e gravata, penso que um homem atinge seu ápice quando imerge nesse traje.
Muitos disseram que eu deveria alugar a vestimenta, que economizaria uns trocados e talicoisa. Em verdade, vos digo: outro de meus melhores amigos casa em outubro e, macacos me mordam, também serei padrinho dessa união, o que por si só justifica a compra em detrimento do aluguel.

Bem, mas a breve introdução acima não significa que dissertarei acerca da ida até a loja para adquirir o terno, até porque correu tudo dentro da normalidade, sem sobressaltos. Cheguei lá, experimentei o paletó, a calça, uma gravata pra combinar com o vestido da Dani e pimba, passa o cartão aí, tia. À vista, na bucha. Rápido e rasteiro.
Estava aqui, absorto em meus pensamentos matinais às vésperas de mais jogos da Copa para comentar no Twitter, conjecturando sobre todos esses casamentos, sobre a evolução dos relacionamentos e esse plano de conquista que nos leva a olhar no grão dos olhos da pessoa amada, pôr Bruno e Marrone de trilha sonora e murmurar: quer casar comigo?
Conquistar o amor de alguém a ponto de escolher a pessoa para dividir a mesma cama para o resto da vida é como entregar a alguém a chave da nossa casa. Ora, não se concede acesso livre a ninguém a um lugar tão importante quanto o nosso lar, doce lar, recôndito do descanso mais frugal.
Por mais que isso pareça corriqueiro, não é. Imagine que você esteja em sua casa, atiradão no sofá, só de cueca, bebendo um Tang sabor laranja e assistindo ao Pica-Pau, quando, de súbito, entra seu melhor amigo todo bonachão, abre a geladeira, gruda o beiço num iogurte, puxa uma cadeira e desata a falar do quão cansativo foi o seu dia de trabalho. Não dá, né?
Existem, portanto, níveis de intimidade que são delimitados por nós e que são concedidos a qualquer pessoa, desde um estranho, até o melhor amigo. Nenhum deles, contudo, tem a mesma liberdade que aquela pessoa que tem o green card da sua vida e sabe a senha do seu coração.
Após refletir sobre isso, entendi o porquê de ninguém nunca ter conseguido uma cópia da chave que só a Dani tem há quase nove anos. A permissividade que eu construí com ela não aconteceu pela segunda vez em nenhuma outra oportunidade e, com isso, sempre que alguém tentou se aproximar, deu com o nariz na porta. Afortunadamente, a senha para o livre acesso à área VIP da minha afetividade leva o nome, entre outros caracteres, da mulher da minha vida. E não existe cópia da chave, definitivamente.

1 comentário:

  1. Cara, você acabou de traduzir tudo que eu penso também sobre casamento, escolhas e tudo o mais.
    Genial, sublime!

    Abraço

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