Um domingo com meu pai

A vida é mesmo cheia de situações inusitadas. Estou eu num churrasco entre amigos, mastigando um naco de carne entre uma lata de cerveja e outra, quando sou chamado para uma conversa reservada a um grupinho de quatro ou cinco:

- Antônio, duvido que tu adivinhe quem saiu comigo e com o Biriba ontem!

Antes que eu pudesse arriscar um palpite como quem tenta, em vão, pealar um novilho zebu a campo aberto, a afirmação seguinte dificultou o raciocínio:

- Te dou quantas chances tu quiser, duvido que adivinhe!

Boquiaberto, contudo não sem esquecer de mastigar de vez em quando, olhei pra cima e fiz aquela típica cara de emoticon do MSN quando está tentando pensar. Mesmo assim, sequer houve tempo hábil para que eu proferisse qualquer palavra. A resposta veio ávida feito... um novilho zebu a campo aberto:

- Teu coroa!

Meu pai. Meu genitor. Meu nome todo sem o Junior. Meus amigos levaram meu pai para a balada... e adoraram! De fato, devo atestar que ele é um camarada deveras animado. Depois de vinte e cinco anos, a vida me ensinou que a muralha da China de hoje pode ser a pedrinha no sapato de amanhã. Com isso, aprendi que guardar mágoa é como beber veneno e esperar que o outro morra. Isso fez com que eu avançasse um bocado nas relações familiares.
Outro dia, noutro churrasco, já sem mastigar qualquer resquício de carne, todavia multiplicando as latas de cerveja, estávamos, meu pai e eu, filosofando acerca do que interessa aos ébrios. Sim, porque o álcool, além de matar milhares no trânsito, lotar as reuniões de Alcoólicos Anônimos e virar reportagem no Profissão Repórter, ele também aproxima as pessoas do que pensavam Platão, Aristóteles e Sócrates, que, se fossem vivos atualmente, seriam intrépidos defensores da cerveja como fator determinante para uma boa filosofada.
Bueno, filosofávamos, pois. Nisso, num rompante que mais pareceu o galope de um novilho zebu a campo aberto, meu coro... digo, meu pai, indagou-me com tenacidade:

- Por que tu não escreveu mais no blog?

Como você, caro leitor, também deve saber, ébrios gaguejam. E foi isso que fiz, gaguejei, tentei articular uma resposta plausível, mas fui interrompido. Aliás, ultimamente as pessoas não me deixam pensar muito antes de uma resposta, como podemos constatar nesse texto:

- Posso te dar uma sugestão? Escreve um texto sobre o dia de hoje. O título pode ser "Um domingo com meu pai"! O que tu acha?

- Fechado.

Promessa é dívida. Mesmo que sob o efeito do lascivo álcool, não sou homem de negar a parada. O curioso é que o dia em questão foi uma terça-feira, feriado de 12 de outubro. Mas, depois de meia-dúzia de geladas, até quarta-feira de cinzas vira domingo.
Pois bem, foi uma terça-feira bastante animada. Jogamos futebol, ou melhor, eu joguei: meu pai era o treinador do time. Perdíamos a partida por 2 a 1, sendo que o primeiro gol nosso originou-se de uma roubada de bola minha, que parti rápido para o ataque, tão rápido quanto... um novilho zebu a campo aberto? O fato é que perdíamos, e algo devia ser feito, de preferência pelo treinador do time.
O pai, então, alterou o esquema da equipe, remanejando seu filho, com um metro e setenta e quatro de altura, para a enferruscada posição de zagueiro, terreno dos maus, dos ferozes, dos biltres dissecadores de fígados do ataque adversário. O resultado da partida? Ganhamos o jogo por 3 a 2. Não que meu recuo para a zaga tenha sido a galinha dos ovos de ouro, no entanto o que importa é que conseguimos o êxito da virada.
Depois da partida, churrasco e cerveja. Realmente, o dia tinha cara de domingo. Naqueles entrementes, a conversa fluiu animadamente e, hosanas, aleluia, estou de volta ao blog. Como disse antes, a vida ensinou-me e continua ensinando muito. Dentre os aprendizados importantes, destaco que nenhuma pessoa é feita só de qualidades, ou só defeitos. Cada um é peculiar, cada fato tem razão de ser, cada lição aparece na hora certa. Às vezes, penso que meu pai demorou vinte e cinco anos para aprender a trilhar os sinuosos caminhos da paternidade. Todavia, se abordarmos a questão por outro ângulo, podemos dizer que eu demorei o mesmo tempo para aprender a ser um filho decente e compreensivo. Mas, e daí? Quem é que quer discutir o sexo dos anjos? Importa que o domingo aconteceu, mesmo sendo uma terça-feira e, de quebra, estou de volta ao blog, com a disposição de um... vocês sabem: novilho zebu a campo aberto.

5 comentários:

  1. NÃO ACREDITO QUE VOU SER A PRIMEIRA, hem.

    Primeiramente, quero dizer que donos de blogs tem o direito de passar períodos sem postar pelo simples fato de que a dona inspiração às vezes resolve desertar.

    Em segundo lugar, acho que o título do texto deveria ser "Um Novilho Zebu a Campo Aberto". Porque é sonoro e... porque eu gosto a palavra Zebu mesmo, é isso aê.

    Terceiro lugar, acho que teu pai deve ser uma figura ímpar, assim como tu. :B

    Quarto lugar, o texto tá LYMDO, como sempre, adoro e sempre indico.

    Quinto lugar, eu sou uma puxa-saco do caralho e é provável que meus elogios já nem surtam efeito sobre o teu ego, sr. Guri-do-que-momento. Mas são sincerosssss, né (:

    Beijoooo! :**

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  2. Mazaaah meu bruxo!
    Tava sentindo falta dos teus textos. Entro todos os dias aqui pra ver se tu escreveu algo. Fiquei feliz por tu ter voltado a escrever.

    Abraço!

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  3. Voltar é sempre bom.
    A gente se despede, chora, tranca até com cadeado, mas, como dizem, "um bom filho à casa torna"...

    Ando na correria para acabar a faculdade e sinto falta de ler os blogs, principalmente o teu, pelo qual tenho um carinho GIGANTE!

    Um beijão em tu!!!!!!!!!!

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  4. Fico feliz que consegui que vc voltasse a escrever. rsrsrsr
    Realmente foi uma terça com cara de domingo, e sinceramente adorei passar o dia com vc meu filho. Um grande beijo.

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  5. Há mais ou menos dois meses não entrava mais no teu blog. Não aguentava mais ler sobre o "susto", rsrsr e, hoje para meu deleite, deparei-me com este texto lindo, emocionante e hilário. Que bom que voltaste a escrever. Minhas manhãs não eram as mesmas sem ler teu blog. Um beijo.

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