Me chamo Asdrúbal e tenho 34 anos. Digo que me chamo, porque ninguém mais me chama. Se eu fosse um cara querido e popular, todos me chamariam. Quem sabe até inventariam um apelido carinhoso, porque Asdrúbal é de dar dó. Nem minha mãe me chama pelo nome, acho que ela se arrependeu de ter me registrado assim. Em contrapartida, os apelidos que ela me deu também não me agradam muito. Não conheço ninguém que goste de atender por “praga, imundícia, estorvo”, fora outros palavrões que ela usa quando está mais irritada ainda.
Sou solteiro e filho único. Além da mamãe, também moro com a vovó Inocência (também não foram generosos com ela ao batizar-lhe, mas pelo menos o nome dela é uma qualidade). Porém, não há diálogo em casa, porque mamãe só me xinga e vovó é muda há 17 anos. Não sei por que ela parou de falar. Até já tentei lhe perguntar, mas minha mãe foi enfática:
- Tu não viu que ela tá muda, imundícia?
Não fiquei triste, assim como nunca fico quando mamãe me destrata, pois ela é a única pessoa que sabe que eu existo. Diz ela que é porque nasci com quatro quilos e meio e de parto normal, o que fez com que ela passasse a caminhar com as pernas um pouco abertas até hoje, fora a dor absurda que ela conta que sentiu.
Minha vida não tem sobressaltos. Sou office-boy de um pequeno escritório que fica no décimo nono andar de um prédio aqui perto de casa. Como sempre chego em cima da hora, o elevador nunca está disponível e sou obrigado a subir a pé. Mas, sou esperto. Sempre subo correndo até o décimo, onde quase sempre consigo alcançá-lo, e aí poupo nove andares.
Meu chefe é muito ocupado, só me deixa tarefas através de bilhetes. Chego no escritório, leio todos e vou para a rua. E é aqui, no elevador, que passo um bom tempo refletindo, pensando na vida e contando minha própria história.
Queria poder dizer que sou feliz, mas não sou. Ninguém me nota, ninguém me deseja bom dia, nem mesmo para apertar algum andar no elevador me pedem. Sou um belo exemplo de Zé Ninguém, apesar de me chamar Asdrúbal.
Fiquei amigo de um mendigo, o Tévez. Conversávamos muito, trocávamos idéias e ele me incentivava a continuar vivo. Apesar de estar sempre bêbado, eu gostava dele. Comprava-lhe roupas e comida, queria o bem dele. As roupas, ele vendia para comprar cachaça, e a comida ele dava ao seu cachorro de estimação, o Biriba. Morreu de cirrose o coitado, isso há uns cinco anos atrás.
Continuei comprando comida para o cão, mas ele quase não comia mais de tristeza após a morte do dono. Na última vez que o vi, ele se coçava muito. Gania. Depois descobri que era sarna, pois acabei pegando a doença e passei para minha avó, que quase voltou a falar, de tanto que se coçava a miserável.
Também tive uma namorada, que conheci através do Tévez. Matilde era feia, não tomava banho, tinha um único dente preto na boca e não enxergava. Sua única vantagem em relação à minha avó era o dente preto e a fala. Namoramos por um bom tempo, e eu também lhe comprava comida e roupas novas. A comida ela adorava, mas as roupas o Tévez também vendia para comprar cachaça. Um dia, ela saiu dizendo que ia comprar cigarros, e nunca mais voltou. Estranhei, porque não sabia que ela fumava. Pelo menos explicou o dente preto.
Essa é minha vida, onde nada de especial acontece. Quando estou alegre, não posso dividir meu sorriso com ninguém. Minha vida está nesse elevador, mas ninguém sabe que eu existo. Se estou triste, como hoje, não há ninguém para perguntar o que está acontecendo, para oferecer ajuda, ou um ombro amigo. Sou um zero à esquerda, um corpo errante no meio da multidão.
Para completar minha desgraça, devo ter comido algo estragado, porque minha barriga está doendo. Estou suando e o elevador está lotado. À minha direita, uma senhora gorda não pára de olhar para o relógio. À esquerda, um rapaz novo, provavelmente motoboy, porque carrega um capacete e um malote de documentos.
Argh, minha barriga dói. Meu intestino se contrai o tempo todo. Que agonia, preciso me controlar. Ainda estamos apenas no décimo segundo andar, mas eu preciso de um banheiro urgente. Ugh, outra contração. Não vai dar! Não vai dar! Não vai...
- Trrrrrrrrrrrrraque!
- Cara, tu peidou?
- Não acredito que tu fez isso no elevador lotado, e no décimo segundo andar!
***
Minha vida mudou depois daquele flato inusitado. Tá certo que todos saíram correndo no décimo primeiro andar, tapando os narizes enquanto me xingavam de apelidos muito piores do que os da minha mãe. Entretanto, pela primeira vez, eu fui notado. Enfim, viram que eu existo. Pude ver todas as pessoas do elevador me olhando nos olhos, como somente o Tévez havia feito até hoje (e minha avó, pedindo socorro com os olhos quando pegou sarna). Olhos arregalados, enquanto um senhor calvo apertava incessantemente pelo próximo andar.
A maior felicidade que já tive foi ver uma menininha perguntando à mãe dela:
- Que cheiro é esse, mãe?
- Foi aquele moço ali atrás, filha. Agora tapa o nariz.
Depois daquele dia, todos me cumprimentam quando entro no elevador. Nos primeiros dias, alguns até perguntavam se eu tinha melhorado da dor de barriga, não sei se por educação, ou precaução. Menos a senhora gorda, que estava justamente na linha de tiro do meu intestino naquele fatídico dia. Quando as portas se abrem e ela vê que eu estou descendo, desiste e vai de escada. Dizem que já emagreceu catorze quilos.
Morre Albino Manique
-
Com profundo pesar noticiamos o falecimento de Albino Manique, lenda da
música gaúcha e do acordeom, hoje, aos 80 anos.
Conhecido e reconhecido por me...
Há 20 horas
meeeeeeeeeeu
ResponderExcluireu me acabo de rir, é sério.
como é que tu consegue, hein? kkkkkkkkkk
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirfiquei com pena do Asdrúbal coitado, so teve um amigo q era mendigo e morreu, namorou uma mendiga feia, cega e fedorenta, e o unico dia em q teve reconhecimento foi qndo peidou! hduiashuidhasudsa
ResponderExcluircoitadoooo
bjao
Como você consegue?
ResponderExcluirSó rindo daqui...
Bjitos!
aushaus!
ResponderExcluir"Eu me chamo pq ngm me chama..."
aushau!
Me fez lembrar um pouco do filme "O Closet" tmb...
hehe!
Bjus!
Ana
(não tô conseguindo enviar de outro jeito)
Passando aqui pela primeira vez. Adorei o texto!
ResponderExcluirAh, e eu sou gaúcha também, de Porto Alegre. :)
Beijo!
Asdúbral foi pra acabáá!
ResponderExcluirMas vc foi ótimo Antonio.. adoreiiii.. fiquei até com dó dessa pessoa! ahahhaha
beiijoos
aahh.. e qto a ser cobiçado igual ao Bon jovi.. td depende do ponto de vista! hahahaha
O que tu comeu esse últimos dias, hein? Inspiração em comprimidos?
ResponderExcluir----------
É por essas histórias e outras que eu noto que minha vida é cor de rosa e não há do que reclamar.
Abração, mano velho!
[É por essas histórias e outras que eu noto que minha vida é cor de rosa e não há do que reclamar.]²
ResponderExcluirConcordo com Marquinhos!!!!
Ei... adoro o jeito que tu conta estórias sabia?????? É, adoro sim...
Beijão pra tu
Peralá... se me acaba assim....
ResponderExcluirCara, era pra eu ta morrendo de rir, mas eu ja ri bastante, agora estou indignada com tanto talento o.O
Eu ja escrevi umas historias assim, mas acho que perdi essa veia humoristica.
Mas vc foi formidavel! Que esso!
Adorei mesmo!!!
Agora já posso rir? kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
Ai Antonio.. eu ainda te mato.
Mas continue assim. Vc mereceu mesmo o selo de mente iluminada ;)
Um beijo!
Tbm fiquei com medo o.O
ResponderExcluirSera que isso tem cura???
uahuahuahauaauhauhauahha
PS: Obrigada pelas mudas de lírio.. eu adoro lírios =D
ResponderExcluirEntão, realmente "há males que vêm para o bem"?
ResponderExcluirSe foi preciso um ato destes pra voltar ao mundo, que seja!
E ainda ajudou a tia a emagrecer! hehehehehe...
Muito bom.
Bjinhos.
Antonioooo.. mas me cagoo d rii desas piadas aee...ausausuashas
ResponderExcluirmto bom msmoo...parabéns!!
beijaooo...o/
Tu escreveu isso pensando em mim, né?
ResponderExcluirEU SEI!
Ainda bem que mudou meu nome, idade e função... Apesar que eu nunca namorei anguém desdentado.
HAUHUAhUAhUAhUHA
Mas ó, o lance do elevador, será que da certo mesmo? Eu senti minha vida na faculdade escrita ali.
T_T
:**
Eu simplesmente A-DO-RO esse lugar!!! hauhuah
ResponderExcluirMe acabei d tanto rir!! =D
Parabéns pelo talento, Antonio! ;)
Beeijos! Se cuida!
RSRSRSRS!!!!
ResponderExcluirAntônio...PERFEITAA sua história!!!
Tebe até um final feliz...RSRSRSRS um pouco mal cheiroso talvez, mas feliz!!!
RSRSRSRSRS ^^
Você devia escrever pra um jornal =D
Adorei muito muito muito!!!
=***
Eu me identifico com esse sujeito! ahauhauahuahuhuah - Ótima história!
ResponderExcluirpelo menos ele foi util pra coitada da gorda...
ResponderExcluirrapaz, essa é a história de como um peido pode ser importante! até me assustei...
aah, estamos fazendo uma enquete lá no blog e eu queria a sua opniao!
Não conhecia o teu Asdrúbal, catedrático. Os dois se parecem bastante, impressionante a sina dos Asdrúbals e a ótica dos Antonios.
ResponderExcluirGrande abraço, amigo!