A pior noite da minha vida

Estoy aquí by Shakira on Grooveshark

São três da manhã. Agora há pouco, deitado na cama, rolava de um lado para o outro feito um bolinho de chuva polvilhado em açúcar com canela. Não aguentando tal situação movediça, decidi descer para escrever um pouco e, quem sabe, encontrar o sono que perdi.
Contudo, acabo de descobrir o motivo real da viagem do corvo¹ que minha sonolência fez. Tudo começou com um pecado capital: a gula. Detonei uma pizza brotinho de chocolate logo após comer quatro pães de queijo e dois pastéis também de queijo. Na quarta de cinzas não se deve comer carne, não esqueçam disso. O papa pode renunciar seu cargo quantas vezes quiser, mas seguirei fiel aos preceitos católicos, até porque quem toma anticoncepcional aqui em casa não sou eu.
O fato é que, depois de devorar a pizza inadequadamente, meu estômago pareceu ter engolido uma bigorna atravessada. Resolvi, pois, fazer um chá. Fui até a caixinha dos sachês, peguei o primeiro que apareceu e tasquei água fervente numa xícara. Bebi com gosto e galhardia. Todavia, só agora constatei que o danado era o tal chá verde. O lado bom é que ajuda a emagrecer; o ruim é que contém cafeína. "Que burro, dá zero pra ele", diria o filósofo.
"Y ahora estoy aqui, queriendo convertir los campos en ciudad". Plena madrugada, meu sono foi pra balada de braços dados com o efeito do chazinho e o que me resta é recordar alguma lembrança do passado para contar a vocês e tentar dar algum sentido a este texto. Permitam que eu conte, portanto, como foi a pior noite desta minha curta vida.
Já tive algumas madrugadas difíceis, como todos devem ter em suas vidas. Enfrentei algumas madrugadas em claro em condições inóspitas, como velórios, diarreias e agruras do álcool. De todo modo, quando passamos por situações assim, nossas mentes nos preparam para a dificuldade. É como se um dispositivo fosse acionado no cérebro do vivente e o avisasse de que a tempestade se aproxima. No caso do porre, por cima; na diarreia, por baixo; no velório, de todos os lados.
Minha pior noite não foi em nenhuma das três opções supracitadas. Mesmo assim, foi tremendamente horrível, não dormi um minuto sequer. Começa que fazia um calor atroz em Novo Hamburgo, São Pedro certamente assava um churrasco na Fazenda Paraíso. Trouxe o colchão para a cozinha e ali deitei, esturricado feito uma panqueca.
Meu coração estava dividido, essa é a verdade. Qualquer decisão que eu tomasse afetaria a terceiros e, pior que isso, invariavelmente faria alguém sofrer unicamente por minha causa. Passei a conjecturar mil soluções, mas todas me levavam ao mesmo labirinto que mostrava a inutilidade de tentar resolver o que não tinha remédio. Aliado ao calor exorbitante, passei a suar frio e ter taquicardia. Sofri um bocado com aquele impasse terrível, queria que a manhã chegasse logo e eu pudesse tentar correr atrás do prejuízo causado por mim a pessoas inocentes.
A certa altura da madrugada, entrei em desespero silencioso. Batia os pés no colchão com voracidade e suplicava ao relógio que andasse ligeiro. Nessas horas, porém, o tempo é nosso inimigo. Não havia o que fazer a não ser esperar. E foi aí, nessa espera, que minha porquinha torceu o rabo. Passei a noite em claro, os olhos esbugalhados de pavor e com um cansaço no corpo que me dava a impressão de ter sido atropelado por uma manada de gnus.
Foi a noite mais adolescente da minha vida, certamente. Quando o primeiro galo cantou ao raiar da manhã, levantei num pulo e fui conferir o telecurso. Tive lições de matemática, e ainda assim não conseguia resolver minha equação sentimental. Mais algumas horas se passaram e, assim que pude, fui ao encontro dos problemas para resolvê-los. Não foi fácil, lágrimas rolaram, senti-me um déspota, mas foi a única solução para que eu conseguisse voltar a dormir.
Queria poder dar mais detalhes, mas ser enigmático faz parte do show. A verdade é que, comparada àquela madrugada tenebrosa, um chá verde com cafeína é literalmente café pequeno. Apenas uma traquinagem qualquer da vida adulta, de quem ainda precisa aprender um pouco sobre ervas e sobre a vida, mas cujo sono estará estabilizado sem sobressaltos no dia seguinte. De qualquer forma, fica a lição que encontrei no Google: "O chá não deve ser tomado após as refeições porque a cafeína prejudica a absorção do ferro e da vitamina C pelo organismo, e nem de noite, para não atrapalhar o sono".


¹ Viajar e demorar muito para voltar.

5 comentários:

  1. Dia desses, entre o Natal e o Ano Novo, passei uma madrugada dessas, um calor 'dufinferno', literalmente, não me deixava pregar o olho.
    Não tinha nada pra resolver, mas amanhecer fez uma baita diferença já. rs


    Nada de chá verde antes de dormir: anotado.
    Apesar de que, meu sono anda bem assim como o seu e da Dani, um helicóptero com obesidade, carregando um elefante.

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  2. Eu gosto demais de perder o sono. A madrugada é tão produtiva... estou com saudades de escrever assim, com naturalidade e narrativa que prende, por menor que a história pareça. Acho que perdi o dom. Que bom que ainda posso ler você.

    Beijos

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  3. Eu já tive dificuldades para dormir por causa de assuntos amorosos, mas até hoje nunca perdi uma noite inteira. Dormir é muito bom nessa situação, é uma fuga para um lugar em que tu não lembra de seja lá qual foro o motivo do sofrimento...

    Abração!

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  4. Que tal "embutir" um google em nosso corpo pra cada vez que a gente for fazer a "merdinha" piscar uma luz com os "advertisings"??? Viajei longe agora hahahahhaa... mas o fato é que insônia é algo que não faz parte de mim... acho até que vou escrever sobre sono demais hahahaha
    Bjusssss

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  5. Ainda bem que essa noite em claro foi só da lembrança e não da dor em si, né!

    São favoráveis tuas madrugadas assim, material bom pra gente ler :)

    Beijo, guri!

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