Bodas de algodão

Com toda a propriedade, afirmo que não há lugar que testemunhe melhor a história do meu relacionamento com a Dani do que este blog. É aqui que, desde 2004, despejo todas as minhas considerações, lamúrias e, claro, os relatos de bons momentos vividos ao lado de minha esposa. Desde quando éramos namoradinhos, separadinhos, namorados de novo, separados, aí chorei por ela, corri atrás, reconquistei, noivei, casei e pronto. Este seria um resumo cretino de todo o que foi vivido pelo casal, mas obviamente não cometerei o crime de parar por aqui, já que se fizesse isso correria o sério risco da patroa decepar meus testículos e atirar aos cães famintos.
Hoje, vinte e dois de outubro, completamos dois anos de casados. Em verdade, também é uma história curta, já que nos conhecemos há doze. Por outro lado, impressiona-me a maneira como o tempo voou desde o sim matrimonial até as nossas bodas de algodão. Parece que foi ontem que comemos peixe cru em nosso primeiro aniversário de casamento, uma experiência desastrada que este ano não se repetirá.
Vejo muita gente difamar o matrimônio, falam mal uma barbaridade. Seja em tom de brincadeira, descaso ou lamento, é fato que a credibilidade de ir ao altar e jurar amor eterno a alguém decresceu um bocado desde o tempo de nossos avós. Na minha opinião, isso se dá pelo simples fato de que houve uma libertação da sociedade de tudo o que lhe amarrava, chegamos num certo ponto em que virou moda revoltar-se contra o que precisava ser assinado para existir e, assim, jogaram a fama do casamento no barro e deflagraram-no como instituição falida.
Sou bem sincero: a mim pouco importa o que cada um pensa. Respeito quem se junta e considero legítima qualquer união onde haja amor, respeito e cumplicidade. Igualmente, agora com essa polêmica do casamento gay, digo que cada um é dono do seu nariz e deve buscar a felicidade num relacionamento que lhe complete. Se concordo ou não, de que adianta? A sexualidade de cada indivíduo é particular, não cabe a ninguém ficar julgando. Prefiro deixar a polêmica de lado e defender unicamente que cada pessoa seja feliz no amor. E, caso o vivente não veja necessidade em ter um companheiro ou companheira para o resto da vida, que fique então solteiro, satisfeito e realizado.
Demagogias à parte, estou aqui para tratar do meu casamento feliz e pimpão. Que não é fácil, isso todos sabem. Pelo contrário: dividir sua vida com o outro requer um bocado de paciência. Não consigo identificar outro adjetivo que seja mais importante num relacionamento do que muita, mas muita paciência. Contarei aqui alguns detalhes sórdidos que ilustrarão o porquê de tal característica aparecer no topo das minhas necessidades matrimoniais.
Eu, por exemplo, só fui descobrir que a Dani tem chulé depois de casado. No início demorei para identificar de onde vinha aquele cheiro de cadáver em decomposição que inundava nossa sala às seis e meia da tarde, mas logo comecei a observar que tal fenômeno só acontecia depois que ela tirava os sapatos. Bem, a paciência é uma virtude e resolvi fazer vista grossa. "Que bonitinho, minha mulher tem chulé", pensava com um sorrisinho amarelo nos lábios.
Com o tempo, fui obrigado a reclamar. Nas primeiras vezes ela riu, achou graça. Sugeri, calmamente, que usasse um talco. Evoluí sugerindo que lavasse os pés. Até que, quando já pensava em denunciar o caso para a vigilância sanitária, finalmente tivemos uma conversa franca e definitiva, pois meu pobre nariz não aguentava mais e percebi que teria uma vida inteira pela frente com aquele chulé arrombando minhas narinas. Agora tá supimpa, pois abrimos as janelas, os sapatos ficam no quarto e, em caso de emergência, máscaras de oxigênio cairão sobre a minha cabeça.
Tirando isso, resta só a mania de limpeza, ainda que eu ache que essa é uma característica inerente à quase todas as mulheres e ausente na maioria dos homens. A Dani simplesmente vive arrumando a casa, a toda hora, a todo minuto, por todos os dias de minha vida. Na saúde, na doença, na alegria e, principalmente, na brabeza, e é aí que a porquinha torce o rabo. Quando uma vassoura passa vorazmente por sobre meus pés, percebo que minha bagunça ultrapassou todos os limites desejáveis. E olhem que não sou tão desorganizado assim!
Tá, admito que tenho um certo problemas com jogos. Jogo as coisas em cima da mesa, jogo as roupas em cima da cama, jogo as escovas de dentes por sobre a pia. Sim, tenho duas escovas e a Dani reclama muito disso. Não tenho culpa que ela tenha só vinte e dois dentes, enquanto que além dos meus ainda tenho que escovar um aparelho acrílico que parece uma dentadura que uso todas as noites antes de dormir. Por todos os dias de minha vida. Há coisas que são, como o casamento, para sempre. Por isso uso duas escovas.
Também uso o fio dental regularmente e, quando como carne, tal atividade torna-se um circo dos horrores. Saem pedaços enormes a cada passada e isso naturalmente causa um nojo absurdo em minha esposa. Aí, como homem sacana e infantil que sou, fico mostrando a carne gosmenta e a persigo dentro de casa, pois adoro dar risada das caras que ela faz.
E por falar em ser sacana, meu lado pentelho incomoda um pouco. Vocês, que leem meu blog e acham os textos cômicos, certamente não veriam tanta graça assim se eu voltimeia me escondesse pelos cantos e saísse dando sustos na calada da noite em cada um. Pois, acreditem, faço muito isso em casa. Como diria o Poderoso Castiga, é engraçado pra c@r@*&%$*! Teve um esses dias que foi o máximo, vou contar: a Dani foi escovar os dentes antes de dormir e eu, pé ante pé, esgueirei-me pelo chão, apaguei todas as luzes e simplesmente deitei de bruços na frente da porta do banheiro. Gente, o susto que ela levou ao abrir a porta foi coisa de cinema! Eu devia ganhar o Oscar da criatividade em sustos matrimoniais!
Sacanagens à parte, devo falar sério e afirmar que, passados dois anos, estou plenamente realizado em nosso casamento. Sei que não sou o marido perfeito e estou bem longe disso. Inclusive, sou sincero em dizer que nem quero ser perfeito. Primeiro, porque perfeição não existe; e depois, porque não consigo me ver como aqueles maridos docinhos demais, que vestem avental, lavam louça e massageiam os pés cansados da esposa. Deusolivre sentir aquele cheiro de chulé só pra ser galante!
O meu jeito de ser é este e, se a Dani me escolheu para o resto da vida, terá de se adaptar a alguns sustinhos esporádicos, bem como eu tenho certeza absoluta de que tirei a sorte grande em encontrar a mulher da minha vida tão cedo. Alguns nunca encontram e queimam seus cartuchos em várias tentativas, enquanto que outros até conseguem na segunda ou terceira, mas aí o salário se esvai em pensões alimentícias. Já eu, piegas e faceiro, optei pelo tradicional, casei no civil, na igreja, prometi o sim eterno e, com uma forcinha de Deus nas horas delicadas, tenho fé que ficarei velhinho ao lado da minha amada loirinha, desdentada e chulepenta.


3 comentários:

  1. Eu tô aqui com a janela aberta pra comentar faz tempo, porque não sei o que dizer.
    Claro, quase morri de rir do humor característicamente Antoniano, mas também fiquei indignada por revelar os segredos mais obscuros da Dani, pois é complicado pra mulher usar sapato e sapatilha! Dá um cheirinho ruim mesmo. :/
    Gabriel já providenciou máscaras de oxigênio, antes que venha com gracinhas e piadinhas. :p

    Enfim, dois anos!!!! E mais de um que acompanho a vida de vocês, pelo blog e nossa amizade! E vocês dois, são cada dia mais pra mim, exemplo de um casal feliz e apaixonado!
    Que daqui um ano e oito meses, quando eu escrever sobre minhas bodas de algodão, você venha e comente: Eu estive presente!!
    Porque foi lindimais olhar pro lado e ver vocês ali, totalmente importados do sul do país, na minha Minas, na minha vida!

    Que este amor só cresça e frutifique (sem pressão pra ser tia), porque cês dois são lindimais e bons de mais pra não multiplicar.

    Beijão cheio de carinho mineiro e de saudade apertada.
    É amor, só pode.

    ResponderExcluir
  2. Se eu fosse a Dani, eu te esfolaria vivo por espalhar que a danada tem chulé. Cara, isso não se faz. hahahahah

    Demais esse texto, Ton. Demais esse amor de vocês, a forma como vocês são apaixonados demais um pelo outro, a forma como vocês riem da desgraça interna (ainda vou levar vocês para comer peixe cru DECENTE) e acompanhar a trajetória de vocês é lindimais da conta.

    Que venham anos muitos e bons para firmais e enraizar ainda mais essa relação de sucesso. Vocês merecem toda a felicidade do mundo!

    ♥ ♥ ♥

    www.fernandaprobst.com.br

    ResponderExcluir
  3. Cara, que texto é esse?
    Texto não, uma puta conversa que a gente não quer que termine. Engraçadíssimo e honesto, combinações que não tem como não funcionar em quaisquer publicações.

    Compartilho de sua opinião sobre o casamento e como as pessoas andam abandonando os compromissos na primeira dificuldade. Opiniões podem se dividir, mas um casamento em que suas pessoas verdadeiramente precisam uma da outra não.

    No mais, parabéns por vocês e pela alegria que você conduz esse matrimônio.
    (Em breve farei parte do time dos casados nos confrontos futebolísticos familiares.)

    ResponderExcluir

<< >>