Quem dera ser um peixe...

Separei algumas madeiras, pedaços de pau, pregos, serrote, martelo. Também procurei ordenar os animaizinhos em casais e organizei-os em fila indiana. Meus amigos, do jeito que choveu nesse feriado, obriguei-me a pensar na reedição epopéica de Noé. Quatro dias de água desenfreada já foram, ou seja, faltam apenas 36 para completar a história da Bíblia.
Não foi muito fácil distingüir quero-quero macho de quero-quero fêmea, mas peguei dois que estavam próximos e coloquei na fila. Como diria minha avó e ilustre leitora desse blog, dona Dilma (um beijo!), era água que Deus mandava. O cara passa o ano inteiro esperando por um feriado prolongado, pra acabar fazendo cursinho de oceanografia pela janela.
As plantas já não estavam mais nem faceiras, pelo contrário, pediam clemência ao céu. Por um momento, pensei ter visto uma vaca com equipamento de mergulho, mas não está descartada a hipótese de ter sido miragem.
Hipérboles à parte, meus dias de folga resumiram-se em treinar diferentes posições para dormir e ingerir todo e qualquer tipo de alimento que estava ao alcance dentro de casa. Assisti a todos os canais da parabólica, incluindo os fantásticos produtos redutores de celulite da Rede TV e também aquelas maquininhas milagrosas que fazem suco das frutas com casca e tudo.
Mas, como tudo na vida tem os dois lados, meu feriado também teve os seus: oceano Índico e Pacífico. Tá, não foi isso, mas poderia ser. Botei o cérebro pra funcionar e tratei de pôr em ordem algumas questões pendentes no meu pensamento.
Meu ego, até então em missão na África (na última vez que nos falamos, ele estava na Mauritânia, alimentando rinocerontes órfãos), chegou de surpresa, a bordo de uma canoa alugada em Três Coroas, único meio de acesso em meio ao temporal que desabava insistentemente. Sentamos, botamos os papos em dia e começamos a analisar nossa situação enquanto pessoa, no caso, eu.
Foi um bom exercício de paciência e auto-controle. Até convidei-o para um banho de chuva, mas ele não sabe nadar. Dessa forma, preferimos refletir sobre os últimos acontecimentos e sentimentos que povoaram minha vida enquanto ele viajava pelo árido deserto marroquino.
O texto do caracol fez um sentido e tanto, nem mesmo eu esperava tanta repercussão. Acontece que é por aí que caminham as coisas, na base da paciência, dar tempo ao tempo e deixar acontecer naturalmente (isso me lembra pagode, mas tudo bem).
Em se tratando de Antônio, foi uma conquista e tanto. Consegui enxergar certas respostas que teimava em ignorar, e isso melhorou meus dias de maneira considerável. Entendi que não se pode condicionar a felicidade a um fato ou pessoa isoladamente, mas sim adicionar essa possibilidade à boa fase já existente.
E, macacos me mordam, por quanto tempo condicionei meus sorrisos a uma atitude alheia, o que, convenhamos, é praticamente um suicídio emocional, já que não se pode prever o que o outro sente, ou como agirá diante de uma determinada situação. Mas, é isso aí mesmo, a vida é um aprendizado contínuo, que designa caminhos específicos para que encontremos respostas que, pasmem, estão dentro de nós mesmos.
Acontece que às vezes é preciso que demos algumas voltas antes de olharmos com atenção para o que está tão claro em nossas mentes. Bem diz o ditado mesmo, que o pior cego é aquele que não quer ver. No frigir dos ovos, tudo se acalmou. Parou a chuva, parei a construção da arca, meu ego e eu conseguimos dividir a mesma sala sem qualquer tipo de atrito (requer esforço, é verdade, mas vai tudo bem por enquanto), as conversas fluem com melhor naturalidade e o horizonte dá mostras de que pode haver um pote de ouro no fim do arco-íris.
Pra não quebrar o protocolo, vou ao menos soltar a pombinha branca. Quem sabe ela não traga um ramo verde no bico...

Dois dias para completar vinte e duas primaveras: que momento!

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