Vontades

Às vezes, dá vontade de chorar.
Então, eu lembro da minha mãe, e de todo o esforço que ela faz diariamente pra sustentar nossa casa e ainda terminar o dia com um sorriso acolhedor no rosto, que me saúda inigualavelmente quando eu também chego do trabalho no fim do dia.
Aí, eu choro.
Choro de alegria e agradecimento, por Deus ter me colocado numa casa abençoada e especial.

Às vezes, dá vontade de sumir.
Então, eu lembro dos meus avós, lá na Serra, saudosos da minha presença. Lembro de seus olhares carinhosos, palavras aconchegantes, que sempre mimaram minha existência. Da comida das avós, da experiência dos meus avôs e de tudo o que eles representam para mim.
Aí, eu sumo.
Sumo para meu recanto em São Chico, visito minha família e, longe de tudo, passo os melhores momentos de minha vida curtindo a corujice dos que me amam incondicionalmente durante toda a minha vida.

Às vezes, dá vontade de morrer.
Então, eu lembro dos meus amigos, que me elogiam, requisitam minha presença, valorizam minhas qualidades e dedicam um pouco de suas vidas à partilha com a minha. Dos carinhos, abraços, conversas, rodas de violão, jantas e tudo o que me leva à plenitude como pessoa. Momentos que passamos juntos e solidificam a amizade que construímos.
Aí, eu morro.
Morro de amores por eles, mas um amor completo, que deseja felicidade, que provém felicidade, que faz acontecer o brilho no coração de quem se ama verdadeiramente. Perto, longe, não importa, são amigos verdadeiros e fiéis, para a eternidade.

Às vezes, dá vontade de matar.
Então, eu lembro do meu irmão, que sempre me convida pra jogar videogame com ele. Lembro do pessoal do futebol, da hora do almoço que está chegando, da sede que o calor provoca.
Aí, eu mato.
Mato a vontade de jogar videogame, a fome de bola e a que me deixava faminto até o meio-dia, e também a sede, seja com uma cerveja bem gelada, ou um suco natural.

Às vezes, dá vontade de desistir.
Então, eu lembro que estou correndo demais, planejando demais, dando importância ao que não tem tanto valor e esquecendo de dar atenção a muita gente que precisa de mim.
Aí, eu desisto.
Desisto de tantos compromissos inúteis, futilidades e riquezas materiais, e reservo esse tempo para ficar em casa conversando com minha mãe, ou de papo pro ar com um de meus amigos, rindo da vida com minha namorada e me despreocupo do que não é urgente.

Às vezes, dá vontade de parar.
Então, eu lembro de tanta gente que está em situação absurdamente pior do que a minha. Pessoas que passam fome, necessidades básicas de saúde, moradia e afeto. Famílias desestruturadas, sem acesso à educação e à igualdade social.
Aí, eu paro.
Paro de me queixar da vida, de questionar porquês supérfluos, de remar contra a maré em fatos incontestáveis e dou tempo para as coisas acontecerem. Deixo de ficar acomodado, vendo tudo pela televisão, e tento fazer algo para realmente mudar o que está errado à minha volta.

As vontades existem para serem sentidas. Cabe a nós escolhermos a direção que elas tomarão, e agir de maneira que elas se concretizem de alguma forma positiva. Nem sempre um verbo dito “ruim” precisa ser executado de forma a prejudicar. Matar, morrer, desistir, chorar, tudo isso é próprio do ser humano, não há como negar os instintos. No entanto, nossa racionalidade precisa unir-se ao sentimento para que vivamos intensamente, e de forma a fazer algo para sempre evoluir e melhorar. Caso contrário, a vida vira uma loteria, com chances ínfimas de sucesso. E, definitivamente, não é o que eu quero pra mim. Porque, se tem uma vontade que eu não perco nunca, é a de viver.

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