Queijo serrano com chimia de figo

Quinta-feira, 9 de outubro de 2008.

O dia em que fui demitido. Fui trabalhar normalmente, pensando ser apenas mais uma simples véspera de sexta-feira, o dia imaculado, esperado e idolatrado pela classe operária. Então, ao meio-dia, descobri que estava com o pescoço à prova, pronto para ser guilhotinado no fim da tarde. E fui mesmo. Nenhum reconhecimento, nada de agradecimentos pelos serviços prestados, nem mesmo um mísero "tchau e bênção". A saída foi o reflexo do que foram os dois anos em que passei num lugar onde a chefia sequer sabia da minha existência como ser humano.

Fiquei triste, é verdade, quase que inconsolável. Porém, tive amigos, família e cachorros que me apoiaram naquela hora difícil e me mostraram que, assim como tudo na vida, aquele mau momento também passaria. Aos poucos, comecei a me reerguer e encarar com resignação aquela porta que a vida havia me fechado. Mesmo nas horas de maiores dificuldades, procurei pensar com fé e acreditar que Deus sempre sabe o que faz.

O tempo passou.

Quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009.

Estava em casa, tranqüilo, apreciando um dia de exceção no infernal inverno hamburguense, já que uma leve brisa fazia companhia ao céu nublado que prenunciava a chuva. Um legítimo dia de nada pra fazer, a não ser gastar as retinas em frente ao computador, bisbilhotando orkuts alheios e ouvindo Matogrosso & Mathias.
Mas, como também sou feito de carne e osso, a certa altura da tarde senti fome. E uma bruta fome. Ataquei os armários com tal voracidade, que as bolachas Maria chegaram a se esconder atrás de um pacote de polenta pronta, de tanto medo que meu instinto animalesco as devorasse com margarina sem dó, nem piedade.
Só que eu não queria comer bolachas Maria com margarina. Sei lá, tava com fome de outra coisa, entendem? Devia ser algo derivado da gula, pecado capital que mascara a fome e a transforma numa espécie de soberba, a ponto de, numa atitude egoísta com quem passa fome de verdade, o cara se dar ao luxo de escolher o que vai comer.
Foi então que lembrei do queijo serrano que trouxe de São Chico. Meu avô mesmo é quem faz, e nessas férias até eu pus a mão na massa, ou melhor, na coalhada. Gosto mais de ajudar a preparar, do que propriamente de consumi-lo depois, contudo meu cérebro fixou seus objetivos naquele queijo e, decidido, parti para cima do infeliz com uma faca de serrinha. Poucos segundos depois, a primeira fatia já rumava para minha boca. Mordi. Mastiguei. Engoli.
Tenho que lhes dizer, foi muito sem graça. O queijo em si estava bom, mas faltava algo, um toque refinado de gourmet. Abri a geladeira e fiz um rápido reconhecimento da área. Minha mãe, que assistia ao meu ataque de camarote, apontou-me o fundo da primeira prateleira, onde se encontrava esquecida um singelo pote de chimia de figo. Decidi, então, arriscar.
Cortei a segunda fatia e, com a mesma faca, besuntei o queijo com uma espessa camada de chimia de figo. Ficou estranho, é verdade, porém, quando minha língua detectou o sabor daquela mistura inusitada, algo cósmico aconteceu. Que manjar dos deuses, que descoberta! Cortei mais uma fatia de queijo, e outra, e uma quarta, todas acompanhadas de camadas e mais camadas da anistiada chimia, quase excedendo o prazo de validade, dotado de tamanha felicidade, que até as bolachas Maria aplaudiram.
Uma grande descoberta culinária, sem dúvida. Esfacelei o pobre do queijo, mas valeu à pena. Depois, com o estômago forrado, como bom preguiçoso num dia de ócio puro, voltei para a frente do computador.

Quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009.

O telefone tocou. Quando atendi, quase que pude ouvir as trombetas dos querubins ecoando nos céus, anunciando a boa nova. Era uma nova porta se abrindo em minha vida.
Confiante, parti rumo ao sucesso, decidido a escrever novas e boas páginas nos tempos que virão. Uma indicação solidária. Uma postura convincente na entrevista. Empregado novamente, começo amanhã.

***

Vejam como a vida é engraçada. Duas quintas-feiras tão diferentes transformaram duas vezes a minha vida. É por isso que eu sigo firme em minhas convicções e procuro viver um dia de cada vez. Ainda mais quando se tem pessoas especiais dando total apoio, tudo pode ser encarado como mais um capítulo, algo passageiro e benéfico para nossa formação.
A conclusão a qual eu chego é que a vida é cheia de descobertas. Seja numa simples fatia de queijo recebendo o nem tão refinado toque da chimia de figo, ou num fato que prova que não fui eu o incapacitado, mas sim Deus que me tirou de um lugar funesto para me dar uma nova oportunidade, descobri que tudo acontece para o bem, para transformar e trazer felicidade. E a vida, assim como queijo serrano com chimia de figo, é uma delícia.

7 comentários:

  1. Aeee meu irmão! Já disse que tô muito orgulhoso, né? Parabéns e desejo muito sucesso nesse novo desafio! Abraço!

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  2. Que coisa boa guri!!!!
    Espero que amanhã seja um bom dia... E que essa nova fase seja também abençoada...

    Beijão pra tu

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  3. Eu ainda não gosot muito de queijo puro, e queijo com chimia é o tipo de mistura que eu ainda não tenho coragem de fazer. Sei lá, algo cultural, minha religião não permite, sei lá.

    Mas parabéns pelo emprego, isso prova que quem não tem emprego não o tem por que ou é azarado pra caramba ou não sabe onde procurar.

    Abração!

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  4. Parabéns!!!

    Como diz minha Avó: A males que vem para o bem.

    Risos!!!

    Adorei sua compração do queijo com figo com a vida....risos!!!

    Parabéns!!Muito sucesso!!!

    Beijinhos!
    Thaís M M

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  5. Tchê, por momentos a vida parece pregar peças na gente. Coisas ruins e inexperadas acontecem e coisas boas que esperamos tanto, não acontecem.
    Contudo, a paciência é uma virtude necessária. Se ontem e o hoje não foram nem são tão bons como imaginamos o amanhã possui grandes chances de ser. E assim sendo, é importante que cada dia vivemos o máximo.

    Boa sorte e sucesso nesta tua nova caminhada.

    Um abraço.

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  6. Branquelo mais lindo!
    vc nao sabe como fico feliz!!!!!
    Parabééénsss!
    huhuhuhuh

    ah, agora com seu novo emprego vai dar pra vc juntar dinheiro (sei que vc é amarrado mesmo! kkkkkkk) pra vim ver uma branqueeeela!
    :D
    \o/

    beijoooooo

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  7. Realmente é muito difícil encontrar um motivo bom no meio de algo que veio ruim pra gente, mas como sempre Deus sabe o que faz.
    E que tenha vindo um novo emprego, um novo fôlego, muito melhor!
    Bjitos!

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