Esquisitices

Peguei uma mania sem-vergonha nos últimos tempos: a cada vez que alguém liga para o escritório, eu pego o sem fio e desando a caminhar dentro da sala. Não sei se é a solidão, a amplitude do espaço que tenho à minha disposição, se são as primeiras manifestações de um possível transtorno obsessivo-compulsivo ou, pura e simplesmente, o bom e velho bicho-carpinteiro. O fato é que, passados trinta segundos de conversa, eu encarno Vanderlei Cordeiro de Lima e inicio uma verdadeira maratona.
Dei-me conta disso há alguns dias, mas só agora resolvi escrever, porque acabo de desligar o telefone e perceber que estava à beira da porta ao final da ligação. Esse advento dos telefones móveis está tomando proporções exacerbadas do ponto de vista comportamental, porém pode ser visto com bons olhos, uma vez que espanta o sedentarismo de passar oito horas sentado numa cadeira matando tempo em frente ao computador - uma mensagem nada alusiva à escrita desse texto, que fique bem claro.
Engraçado essa coisa de manias, tiques nervosos e talicoisa. Devo ter uma série delas sem perceber, e isso me corrói o íntimo, porque não há nada mais pavoroso do que uma pessoa cheia de manias. Não sei se já mencionei noutro texto, mas na sexta série tive um colega - cujo nome não será citado para preservar sua identidade - que, lá pelas tantas, ganhava um faniquito em meio à aula. Era um espasmo na face, um troço cavernoso que fazia o guri repuxar toda a cara pro lado direito, um negócio enfadonho.
Minha classe ficava atrás da dele, então quando eu via sua cabeça pendendo pro lado, já passava a mão no caderno e ia tirar uma dúvida com o professor, só pra ter o prazer de rir da cara de limão azedo que ele fazia. A banca paga e recebe, agora cá estou, feito um palerma, atendendo telefone e troteando feito um pônei de circo pra lá e pra cá dentro da sala.
Justo eu, que pensava que uma das minhas poucas manias públicas era carregar sempre um lenço de nariz a tiracolo. Não que o lenço seja especificamente para fins nasais, todavia eu os uso exclusivamente pra isso. Não curto muito essa história de arrancar tatu a dedadas, como deflagrado na Copa pela nada discreta atitude do treinador da Alemanha. Sendo assim, seguindo o legado do saudoso vô Gentil, incorporei este hábito idoso que me segue desde os primórdios da minha puberdade.
Dificilmente alguém me encontrará sem um lenço no bolso, e talvez por isso eu nutra uma certa aversão a praias de nudismo. Meu grande pavor de não tê-lo comigo é a velha pergunta: e se eu espirrar? Não consigo ficar tranquilo ao pensar que posso estar no meio da rua, a metros de um rolo de papel higiênico e, de repente, uma tsunami de mucosa nasal jorrar do meu nariz e eu ter de sair arcado, com a mão à frente do rosto, feito galinha quando bica um pedaço de couve e corre pra longe das outras. Só de pensar, ganho calafrios.
A grande verdade em meio a isso tudo, como também dizia sabiamente o grande filósofo Gentil Dutra, é uma só: não há quem não tenha lá suas estranhezas e as cultive com naturalidade. O jeito é respirar fundo, assumir certas peculiaridades da vida e aproveitar pra fazer exercício físico durante as chamadas telefônicas que atender no escritório, certo de que, se eu espirrar, não corro o menor risco de passar por ranhento. Há um lenço de prontidão em algum de meus bolsos.

1 comentário:

  1. Aeeee mestre! Isso não é tão esquisito assim. Tenho observado meus colegas de trabalho e muitos tem esse mesmo cosutume. Eu também as vezes hehehehe. Abraço!

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